24 de maio de 2011

A utilidade de Keynes

"A construção de pirâmides, os terremotos e até as guerras podem contribuir para aumentar a riqueza, se a educação dos nossos estadistas nos princípios da economia clássica for um empecilho a uma solução melhor.


É curioso ver como o bom senso popular, em seus esforços para fugir a conclusões absurdas, pôde chegar a preferir as formas e gastos de empréstimos totalmente “inúteis” às que apenas o são parcialmente, e que, por não serem completamente desprovidas de utilidade, tendem a ser julgadas à luz de princípios estritamente “econômicos”. Por exemplo, o auxílio aos desempregados, financiado por empréstimo, é mais facilmente aceito que financiamento de melhorias a um custo inferior à taxa de juros corrente, e a solução de abrir buracos no chão, conhecida pelo nome de mineração de ouro, que não acrescenta nada à riqueza real do mundo e ainda supõe a desutilidade do trabalho, é a mais aceitável de todas".

Keynes, J.M. 1936/ 1996. Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. São Paulo: Editora Nova Cultural; p.144-5 

6 de maio de 2011

Prática teórica e prática prática

"... a possibilidade de mudança depende da capacidade de estar consciente da negatividade última, que é a negatividade localizada no estrato fundamental e não só no efémero fenómeno de superfície. Talvez as mudanças apenas possam ser feitas hoje através de pensamentos que não apontam directamente para a mudança. E é característico que sempre que alguém expressa seriamente pensamentos que não se dirigem à questão “Sim, mas o que é suposto que eu faça, aqui e agora?” – é sempre confrontado com um vazio de raiva (também pode ser um vazio silencioso) que não respeita quaisquer linhas de demarcação, políticas ou outras, simplesmente porque é insuportável não se entregar a uma prática qualquer. Isto é racionalizado, e muito bem racionalizado – é difícil dizer alguma coisa contra isso – pelo argumento: “Bem, é suposto o mundo ficar como está, com todas as suas horríveis possibilidades? Não se deveria fazer alguma coisa contra isso?”. Eu honro essa necessidade; seria o último a atrever-me a dizer algo contra ela. Eu apenas peço-vos que considerem, senhoras e senhores, se a compulsão para fazer alguma coisa aqui e agora, e a tendência para agrilhoar o pensamento que contem, não leva o pensamento a um impasse precisamente onde ele deveria ir mais longe, de forma a chegar ao local onde alguma coisa pode ser mudada. Quando uma vez disse – num sentido irónico e melancólico – que este é o tempo da teoria, eu quis dizer apenas isso. O feitiço que nos amarra hoje consiste, não em último lugar, no facto de ininterruptamente estimular as pessoas a tomarem a acção que elas acreditam que irá quebrar o feitiço; e que isso lhes impede a reflexão sobre elas mesmas e sobre as circunstâncias em que o feitiço pode realmente ser quebrado. Acredito que existe uma correlação precisa entre estes dois fenómenos: por um lado, a raiva que toma as pessoas perante – digamos? – a reflexão sem consequências, e, por outro lado, o momento de libertação contido em tal reflexão."

Adorno, T.W. (2001[1965]); Metaphysics. Concepts and Problems; Standford University Press. Lição 16, p.126, itálico no original.

2 de maio de 2011

O trabalho está na moda?

O homem moderno é um trabalhador. Trabalhar é o seu ideal. O vestuário do homem moderno é, desde o fim do século XVIII, essencialmente um fato de operário.

Johan Huizinga (1924); O declínio da Idade Média; Ed. Ulisseia