Esta história e esta cultura masculinas do trabalho apoiam-se numa série de atitudes individuais. O direito por nascimento da condição do pai possui um magnetismo que ultrapassa a monotonia do trabalho assalariado quotidiano. De acordo como o já tentei descrever, esta integração intra-individual desenvolve-se no interior da família, onde o centro é representado pela figura da mãe. E no quadro da vida doméstica, o poder económico do pai encontra-se envolvido por toda uma mitologia do trabalho – noções relativas à auto-determinação e à “dignidade” de quem trabalha. É então que o rapaz aprende a linguagem do patriarcado – uma certa maneira de falar acerca do trabalho e da economia familiares – que se torna a base de “senso comum” das noções instituídas a propósito da solidariedade masculina. Assim, um homem falará, por exemplo, do “direito” ao trabalho, encontrando-se neste implícita a ideia de que o trabalho é, em si mesmo, uma necessidade do bem-estar psíquico individual.
A intensidade com que as definições de género penetram as atitudes frente ao “trabalho” não é o mais das vezes plenamente levada em conta. Porque não se trata simplesmente do facto de a sexualidade afectar a divisão do trabalho, distinguindo entre tarefas de homens e tarefas de mulheres. Nem se trata tão somente de um problema legal, susceptível de resolução através da igualdade de salários e de oportunidades. No que se refere a um homem, as definições da masculinidade vigentes afectam o modo através do qual ele vive a experiência do seu próprio trabalho, como uma obrigação e uma responsabilidade de duração vitalícia. Sob certos aspectos, o próprio trabalho só é tornado suportável através das diversas modalidades de compensação que se ligam a uma imagem da masculinidade: esforço físico, camaradagem, recompensa por meio da promoção. Quando o trabalho é insuportável, sucede com frequência ser a masculinidade a assumir (a identificação com a posse do salário, o “sustento da mulher e filhos”) o que faz com que o homem seja capaz de se dispor a trabalhar dia a dia.
Mas, embora se torne a base do conjunto da sua vida adulta, a atitude de um homem relativamente ao trabalho está muito longe de não levantar problemas de maior. É de grande importância darmo-nos conta desse facto, já que, dado o seu modo de organização em termos sociais, a experiência do trabalho representa uma ameaça constante à masculinidade. Aqui, voltamos a encontrar a estrutura central ambivalente da identidade masculina: embora seja o destino próprio de um homem, o trabalho é também uma fonte permanente e difusa de decepções para ele. Nas actuais sociedades capitalistas, com a sua divisão do trabalho extremamente aprofundada e a sua cisão sempre presente entre “trabalho” e “casa”, as expectativas masculinas não podem manter-se senão se integrarem numa unidade psicológica, que as condições de existência do homem que trabalha tornam ao mesmo tempo muito difícil de conquistar. De facto, no mundo do trabalho por si só, a identidade de género não se encontra completa, mas sofre uma gradual e inexorável cisão."
Tolson, Andrew (1977/1983); Os limites da masculinidade (pp.43-44); Assírio Alvim
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